Passou
a ter um medo sincero de ser superficial. Perguntava a todos que
conhecia. Você acha que eu sou superficial, acha que estou falando
demais, talvez um pouco alto, concorda? Estava procurando a sua alma,
era como uma roupa perdida no meio de um armário bagunçado, era como
achar uma pequena chave em uma bolsa grande. Tinha medo de ter perdido a
sua alma. Aquele susto que dá no peito quando se percebe
que algo não está mais ali. Não conseguia chorar. Suas emoções
encontravam paredes firmes, bem feitas, e ela nem viu quando elas se
ergueram. Devem ser as dores, elas são tijolos. Meu Deus, estou subindo
cada vez mais para a superfície de mim, meus olhos já não devem dizer
mais nada, algumas lágrimas se penduram em minhas pálpebras, mas não
largam, não descem, meu peito não arfa. O que é que há, minhas janelas
só tem a vista, não tem ninguém observando. Me desculpa, eu falo um
pouco alto, e falo sempre, mas não sei bem o motivo, talvez eu só queira
estar presente, talvez eu só queira fazer parte, mas talvez você nem me
enxergue. Você me enxerga? Eu não me enxergo, talvez eu precise de
ajuda, me mostra onde tá a minha alma, minhas janelas já estão abertas,
entra aqui e quem sabe você não acha a minha alma em algum canto, atrás
do sofá, às vezes o meu olho não viu.
Seus olhos viam, ou será que
não viam e este seja exatamente o ponto, mas seus olhos brilhavam, eram
disponíveis, era um corpo disponível no mundo, um corpo como qualquer
outro - mas nem tão entregue, simplesmente um corpo disponível para as
provocações do mundo. Hoje fala pelos cotovelos, e fala rouca, fala
tanto que dá tudo de mão beijada, não tem muito mistério, seus olhos são
um pouco ocos, o que é que há, não sei, me quebrem as paredes, pulem a
janela dos meus olhos e procurem a minha alma até que ela seja vista. Me
ajudem, podem abrir tudo, escancarar, abrir as portas, enxaguar a
poeira, entre, a casa é sua, ache algo que ainda seja vivo e diz que
esse algo sou eu.
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