20 de fevereiro de 2011

Meu amigo Pedro

Prefácio

Existe um menino.
Um menino, só.
Que não é só por tanto ter o meu amor.
E dele agora falo.



A boca da mãe. Todo ele da mãe. O gênio do pai.

Caminhava pelas ruas de Brasília enquanto relembrava a história da sua vida. O menino que tem o seu lugar no lugar que for, sob apenas uma condição: música, que tenha. Paixão, também. Digo paixão no seu sentido de coisa efêmera, essas sensações de felicidade e euforia. Diferente da irmã, que diz que depois da sua euforia sempre vem o nó e, consequentemente, a tristeza, esse menino gostava de aproveitar alguns prazeres da vida, nem todos eles, - algo dentro dele sempre o fez pisar no freio em algumas ocasiões, diferente dos amigos -, sem medir as consequências.
Afinal ao voltar para a sua rotina, ele estaria, obviamente, preso a alegria que o havia consumido no dia anterior. Ele estaria, como de costume, se esticando pelo ponteiro do relógio, para que não passasse a sensação de liberdade e amor que a cerveja lhe dava, para que não passasse o sacio do vício que o cigarro lhe entranhava, para que não passasse o gosto doce ainda mais doce que sua namorada lhe dava e que -principalmente -, não parasse a música que tocava e o tocava.
Em seu escritório a voz que faz ligações é ainda a que canta e que faz todos os seus orgãos respirarem de forma melhor. A mente que pensa é ainda a que sonha. Os olhos são aqueles ainda que não querem nunca chorar. Que obrigam o peito a ser forte.

Um dos dias em que ele estava percorrendo seu interior, distraído, tocando o seu violão e fazendo música com os achados sobre o próprio, o menino que sempre sorria e sempre lutava sentou numa mesa de bar para matar bem uma aula com os amigos. Cerveja, cigarro e algumas drogas participando desse aflorar da vida que não somente ele mas também os outros adolescentes passavam. Eram ali, tantas mentes cheias de dúvidas, de inquietações, angústias e tanta vontade de ali não estar por não existir. Tanta revolta com o mundo e consigo, tanto cansaço novo. A cerveja descia por sua garganta como algo que anestesiava as dores latentes de sua alma. Eram os seus primeiros goles. Ele gostou. Os amigos fumando e sorrindo lhe mostravam que o cigarro não era só a fumaça que ele repugnava quando sua mãe ia lhe beijar na infância. Agora era também sinal de maturidade e quem sabe uma forma de não-dor. Ou uma forma de foda-se - sabe-se bem que o foda-se dá uma impressão de que realmente tudo vai se foder e desaparecer, foda-se, então pula-se esse obstáculo. Mas, não -, me dá um brother, também quero.
Tudo isso anestesiava as dores do menino do sorriso largo e da boca carnuda. E todos os dias de dúvidas secas em casa, martelando sua cabeça como uma verdade que não quer abandonar, os dias com gosto amargo na boca, dor nas costas e sensação de limitação, todos os dias em que sentia que as pessoas eram mais felizes que ele, vinham à sua mente como seguidos motivos para que ele anestesiasse toda essa vida ainda mais. As lembranças sempre doem. Doem na alma.
Então quem sabe a bebida não o fizesse esquecer de completamente tudo, queimar tudo, foder tudo, acabar com tudo e quem sabe não iria ele chegar em casa e não achar sua mãe uma maluca, o pai um chato e a irmã uma imbecil que se faz de santa?
A vida desse menino então menino mudado ia ganhando outro sentido. Mais do que qualquer uma dessas hipóteses, agora ele não ligava. Não ligava para as brigas cotidianas dos pais, não dava a mínima para o que todos achavam das suas roupas dois numeros mais largas que seu corpo magro e para deixar isso ainda mais largado, ele ouvia em alto e bom som os seus rocks em casa, e ficava ainda mais feliz quando via que estava conseguindo fazer o que queria: incomodar os acomodados.

Era realmente melhor pensar que está sempre tudo bem. É sempre melhor sorrir quando alguém lhe pede o choro. É sempre melhor pensar que se está melhor que o outro para nunca se questionar. Se questionar dói. E ele foi levando a vida sem se questionar, e até ai não havia problema, ele era apenas um adolescente. Adolescentes não são perdoados quando erram. Mas também são entendidos quando são vistos como "ignorantes".

A vida passou sobre ele, o foda-se combinou com a ideia de se esticar pelo relogio e mesmo sendo agora, perante a lei, um adulto, Pedro continua ignorando seus questionamentos. Continua não se cobrando, exceto quanto ao rigor da sua banda, à melodia bem feita e os shows lotados. Exceto depois das brigas em casa, quando o amor que ele tem por todos os chama e ele se arrepende.

Seu pai, outro menino. Que nasceu pobre, estudou valente, ganhou dinheiro e... Traumatizou sua vida. Não sabe o que é viver sem trabalho, e é preciso dizer que o seu orgulho subiu um pouco à cabeça - não que isso não seja entendível.

Sua mãe, uma menina. Tão menina. Ainda tão cheia de duvidas. Nunca teve coragem de jogá-las fora, nem de anestesiá-las, nem de fugir... - É perceptível que as mulheres dessa família são parecidas, assim como os homens se assemelham.

Eles cobram. A família cobra. O mundo cobra. Agora seu habitat é outro. E as condições de vida também, é claro. Visto por esse cenário da vida, Pedro, esse menino, é um homem que não dá muita atenção para as responsabilidades profissionais - "afinal tocar e cantar, aliás, todo tipo de arte, nunca pode ser considerado profissão... Só hobbie, meu filho..." -, que já gostava de beber e que gosta ainda mais. Pois suas lembranças não são somente aquelas da época de adolescente. Quando a cerveja percorre a sua garganta, ela lembra o julgamento com gosto amargo do mundo - que se diz real -, e de sua família. E chega ácida no fígado. Machuca. Ele tem um buraco no peito que depois de 20 anos só pode ser mais ou menos preenchido com o amor. Esse que veio traduzido em pele macia e branca, olhos desenhados e cabelos longos e castanhos. Posto ali, tão perto de casa. Feito assim. Para melhor um pouco, enfim. Já que agora tinha uma menina tão parecida com ele - afinal, parece mesmo que foi tudo sob medida -, ele podia ter um pretexto para ter um pouco mais de paz dentro de casa. Ficava ali, assistia um filme, comia um jantar feito pelo seu amor e pela sua mãe, tinha a sua cerveja, o seu carro, a sua faculdade.

A paixão de tudo parece sempre ter o mesmo efeito que as drogas.
A faculdade não dura para sempre. O namoro já não sacia mais. Vira amor e vai pra alma. O buraco no peito continua. Seu carro já não dá mais o mesmo prazer. É sempre souvenir da sua dependência perante ao pai. E só resta a cerveja. E também o whisky, e o cigarro... E a música.
Volta ele sempre para a sua sensação momentânea, mas que incrivelmente até hoje foi a unica coisa que lhe fez feliz por mais de 2 anos.

Já se passou mais tempo e agora além de tudo esse menino é um homem recém formado, julgado como viciado - sim, ele tem muitos vícios, mas por que vicios? É só o que lhe faz bem. E por que essa denominação mesquinha e humilhante da sociedade? -.
Ele realmente tenta. Trabalha e procura sempre estabelecer a paz. Esse menino é tão grande amor.
Demonstrá-lo não é tão bom para ele, porque ele lembra que quando era todo sentimento isso naõ o fazia bem. Então até hoje ele foge. Mas canaliza boa parte dos seus sentimentos em seu sorriso, que prende as pessoas perto dele, que faz com que as pessoas não tenham coragem de abandoná-lo em hipótese nenhuma.

É tão dificil chamar sua atenção à vida. E mostrar que ele terá que viver conforme a banda toca. Por mais que não seja a de seu gosto.
É tão dificil dizer a alguem que age com emoção que a razão tem o caminho melhor para ele.
O caminho certo é sempre o mais doloroso.
E o mais dificil é decidir por ele. Dar o primeiro passo.
Coisa que esse menino lindo, tão belo, tem adiado há tanto tempo.
Não chamo de covardia. Ele só não quer ir. Ele é insistente. E não teimoso. Ele testa outros caminhos antes. Vai que também dá certo.

Tanta música parece dizê-lo.
E para mim é tão obvio o meu choro quando o imagino feliz e realizado.
É tão igual ao nascer de uma vida vê-lo em cima do palco fazendo o que ele mais gosta, vendo suas veias cheias de vida, suas mãos firmes, segurando o que ele ama...

Eu tento agir com a melhor das razões em minha vida.
Mas confesso que os olhos dele, esse seu amor, essa sua euforia de vida, me conquistam, e eu só posso desejar que a vida não o surpreenda e não queira machucá-lo ainda mais.

Você disse para eu não sair correndo. E não fugir de você.
Aqui estou.
Acho que desde sempre. E para sempre.

Brasília, 20 de fevereiro de 2011
Amo você,
Sua irmã.

Pedro, onde cê vai eu também vou.
Mas tudo acaba onde começou.

Para mudar o mundo
Comece com um passo
Por menor que seja
O primeiro passo é o mais difícil
Quando você pegar seu rumo
Estará andando com firmeza
Você disse que nunca o fez
Porque você pode morrer tentando
Porque você pode morrer tentando



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