17 de outubro de 2011

Apenas seguirei como encantado ao lado teu nº 02

Helena,

Até hoje finjo que tenho suas memórias.
Às vezes esqueço que finjo e me lembro dos dias em que brincávamos na praia: seu filho no meu colo, o seu olhar feliz de mãe, e logo depois o seu olhar- de mulher, feliz em mim.
Nosso beijo era tão somente o ponto final de pequenos e belos momentos escritos por duas mãos. 
Éramos felizes: construíamos momentos, nos olhávamos e nos beijávamos, então.
Eram esses dias na casa de praia que mais me sentiam: a chuva no fim da tarde, a pele macia e tranquila da sua criança  - que eu já sentia como fruto meu - enquanto dormia, e então nós dois no quarto de cima, nos lençóis brancos, um no outro, e eu não tinha pressa. Percorria o seu corpo como um artista frente à uma obra de arte. Você me parecia os livros do Vinícius que tanto amo, e enquanto passeava por tua pele, aprendia como viver um grande amor em cada relevo, em cada estria, em cada pêlo. Até chegar em seu olhar, que não só me chupava feito um zoom, mas me amarrava como algo que não sei. Eles sorriam frouxos, e a sua boca não sabia parar de olhar o meu olho, que te beijava.

Mulher, ali me apaixonei. Ali onde todos os pensamentos passam loucos, embaralhados. E então o futuro, o início, a mulher, o café, o jornal, o menino, a praia, o bar, a mão, o abraço, a luz, a verdade, o brilho, a folia, o samba: tudo se uniu e fez-se amor. 

Às vezes, Helena, penso na vontade que tenho de sentir a vontade que tinha
E de transformá-la verdade em minha vida.
Tenho vontade de voltar no tempo e dizer que seu olhar me penetrou e nunca mais me saiu.
De falar das vontades que me lembravam a memória para ver se então você também  as lembrava...
Quem sabe se poderíamos ter nos amado como o meu relato da minha alma te amou...

Helena, tenho tantas memórias guardadas, e junto delas o medo de perdê-las.

Estou deitado em uma cama nada macia. Talvez esteja sendo vítima da mesma doença que já te trouxe até aqui.
Vejo você nas moças de branco que me trazem a comida, e você realmente deve ser uma delas. A mesma que apresenta o jornal todo dia de manhã e, claro, me serve café no escritório depois do almoço.

Bem amada,
Se deliro, eu gosto.
Se morro,
também.
Afinal, desse modo, juntar-me hei a ti aí em cima, e as memórias se lembrarão
Que esquecidas elas são por esquecerem que um dia existiram sim
Em outras vidas
Dentro de mim.

Um comentário:

  1. Fiquei muito emocionada com esse texto.
    É como se você traduzisse os sonhos que tenho com uma menininha que insiste em querer meu amor de mãe. É como me sinto quando sonho com ela.
    É possível amar um sonho, Barbaára?

    ResponderExcluir