26 de dezembro de 2013

Eu tenho a morte como companheira de quarto



Ela dorme aqui ao lado e é sempre silêncio. A morte é tão calada que eu acho que tenho sede e eu vou até a cozinha sem vontade de voltar. A morte vegeta, é inerte, é isso que me assusta nela. Ela existe, é material, e é matéria morta. 
Eu durmo de frente pra morte. Estou cara a cara com ela - mas ela mal me vê, a morte é inconsciente.

Quando eu tenho preguiça de ir até a cozinha, eu gemo, pra ver se ela ouve e vai me buscar um copo de água - e quem sabe nunca mais volte -. Eu gemo, tento falar, mas me dá um nó no peito e eu não consigo.
 
Eu tenho a morte como companheira de quarto, e tento olhar lá pra fora. As janelas estão enferrujadas e já não se abrem tão facilmente. Às vezes chove aqui dentro e ninguém vê. Ninguém ouve os trovões. No máximo escorre alguma coisa pra varanda, e o tempo limpa. 
Estou tentando dizer, mas eu não sei mais como sair desse quarto. Estamos juntas e atadas, jamais vamos nos separar.
Aqui chove.
Às vezes florece algo no meu peito, e eu sorrio resignada.
Eu sorrio quando ela morre um pouco.




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